domingo, 15 de outubro de 2023

 


Ecos do Que Não Regressa

 

Debaixo do carrasco ao lado da capela silenciosa,

Assisto à cadência lenta do dia demasiado quente

Para Outubro, em baixo na estrada, vai passando

Um ou outro carro, a estas horas ainda se trabalha,

Alguém corta metal, talvez na adega extinta da vila,

Dois cavalos pastam num mesmo lameiro,

Afastados um do outro, tudo verde, como a primavera

Ou um amor antigo que se revisita antes do expirar

Completo da juventude ou no lusco-fusco,

Lentamente o tom da luz que tudo cobre

Vai-se alterando, também há beleza no cansaço,

Aquela última mão de sol por trás dos montes,

Pintando tudo de nostalgia, há sempre algures

Um rádio bem alto para afugentar os vazios

Que tomaram bairro após bairro, como hordas

Mongóis ou enxames bíblicos, a praga lenta

Da desertificação, da qual também eu sou culpado,

Mas mesmo aqui, onde os pássaros

E os rumores das folhas cantam a simplicidade

De um dia quente em paz, sinto uma inexorável

Vontade de fuga e é a essa distância que me sinto pertencer,

As raízes em silêncio subterrâneo, cumprem

A sua fundamental função, longe do fruto.

 

02/10/2023

 

Torre de Dona Chama

 

João Bosco da Silva

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