A Inocência Da Masturbação
“Nada conduz a nada.”
José Agostinho Baptista
Será que foi naquela tarde ao Sol, com os joelhos verdes do musgo, as unhas cheias de terra
E a testa com gotas minúsculas de um suor de felicidade, ou naquele gole de sumo,
Numa paragem incerta entre um mundo e outro em direcção a iguais paragens,
Ou naquele beijo roubado atrás do carro do pão, atrás da escola depois da catequese,
Atrás do tanque, atrás de algo, sempre os beijos que valeram a pena, onde terá ficado,
Perdida a inocência, terá havido, não há memória, é daquelas coisas que só se sentem
Quando se perdem, só se sentem pelo vazio que deixam, como o amor possível
É só aquele que é incompleto, deixando espaço para sonhar, para a ilusão crescer.
Perde-se a capacidade de chover segundos amargos, salgados na língua, com os anos,
Com o crescer persistente da barba e o empalidecer dos cabelos cada vez mais raros
E o coração só cresce para compensar a sua insuficiência, um músculo bruto
Que torna cada vez mais difíceis as inspirações inconscientes, tudo um passo já no ar,
E o pé no chão mal se sente, apressa-se o outro, passa-se e perde-se tudo,
Porque a passagem tudo, nós gotas e as gotas só gotas durante a queda, depois,
Depois acendem-se cigarros com a mão livre, enquanto se tenta encontrar o alívio
De alguém com os dedos frios, confusos nas pregas de carne humedecida pelo vazio
Da noite encostados numa árvore tristíssima, alguém numa varanda às cinco da manhã
E tanto frio, tão frio, como beber apressadamente só para deixar metade escondido
E ser o ridículo, o impossível de uma inocência forçada, perdida, esquecida e improvisada
Nas madrugadas frias, negras de mais um Dezembro, a vida um Dezembro sem Natal,
Uma Missa do Galo inútil, só porque nem ela, nem ele presentes, apesar do corpo de um,
O sangue de outro ainda envenenado pela melancolia, que tomou o lugar dos joelhos verdes
Do musgo, limpou a terra das unhas, tornou o suor azedo e doloroso, o sumo demasiado doce,
A incerteza um caminho, os beijos obrigados pela fome, iluminados pelo artificialismo,
Sem fé, nem moral, secos, como a árvore que presencia uma masturbação misericordiosa,
Arrependida da sua existência, uma inalação de almas que procuram o eternamente perdido.
11.12.2011
Turku
João Bosco da Silva
Muito bom!
ResponderEliminarUm abraço João
http://www.rabiscosincertossaltoemceuaberto.blogspot.com/