Mega Drive
para o Carlos,
Há jogos
hoje, considerados retro, mas que para mim são mais do que o velho antigo,
estar na moda,
São cheiros
que me chegam ao hipocampo através dos olhos, dos ouvidos, dos dedos ou até
Do nariz, o
cheiro do pó que se sopra dos cartuchos de plástico, para os pôr a dar outra
vez,
Um sopro
mágico, um botão pressionado e é Verão, Agosto e a minha mãe cozinha os
mexilhões
Que apanhamos
no rio com os tios de França, a cozinha quente e húmida, o cheiro íntimo do
rio,
Ou é aquela
neta da amiga da minha mãe, à espera que eu perdesse uma vida para poder
Ser ela a
seguir, com o seu cabelo sempre muito curto, olhos vivos e dentes de malandra,
Que depois à
noite, passou o tempo, enquanto a avó tagarelava com a minha mãe na cozinha,
A massajar-me
os tomates e a gaita por fora das calças, nas escadas, ao escuro, apertava com
força,
Até à dor verde,
mas não importava, ainda tinha mais vidas para morrer, aliviava-me os tesões
tenros
De idade, é
quase sempre Verão e o amigo do Porto está na vila e passamos as horas da
canícula
A tentar
chegar ao fim deste jogo, um nível a seguir ao outro, até o Sol nos dar tréguas
e um
Nível nos
esgotar a paciência daquele dia, lá íamos então, comprar um gelado ao quiosque do
jardim
Da vila, ou
beber um ice tea a caminho da casa do outro amigo que morava no extremo oposto,
É o meu pai
a dizer-nos que ficamos com os olhos em bico e a acertar nas minhas dioptrias
E a minha
mãe a desligar-nos o contador da luz, porque isso faz-vos mal tanto tempo, e eu
e o
Meu velho
amigo a caminho de sua casa, a fazer de conta que uma volta para apanhar ar e
Sol,
Mas o
cartucho escondido no bolso, para tentar encontrar o ponto fraco daquele big boss
persistente,
Às vezes
também é no Natal enquanto não se podem abrir as prendas e a missa do galo um
nível
Onde nunca
nenhum de nós tinha chegado, ou as férias de Natal com o primo que mais se
admirava,
Com a sua
colecção de jogos e a neve lá fora a tornar as férias em mais dois ou três dias
de lareira,
Sofá e
botões infinitamente pressionados para aquecer os dedos frios dos jogos na
neve,
É alguém a
dizer que quer ver o futebol e nós de pé, com os comandos na mão, a caminhar
Lentamente em
direcção ao botão vermelho, estava quase, e que alívio acabar um jogo,
Mais uma
conquista, comparável às conquistas de carne dos anos futuros, mas com a doçura
Da inocência,
hoje quando jogo, quando jogamos, o peso dos anos torna-se mais leve, pousa-se
Por momentos
o imenso saco de lixo que fomos acumulando ano após ano e somos quem fomos,
Sopramos o
pó do cartucho e está resolvido, os anos de desuso da criança que fomos
dissipam-se,
Soprámos e vai
dar, a vida vai ter um sentido, em direcção ao último nível, a vida vai ser um
desafio seguro,
Os
objectivos são simples, salvar a princesa, vingar o pai, vencer o cientista
malvado,
Somos
capazes disso tudo, é uma questão começar e persistir, o controlo está nas
nossas mãos.
10.10.2012
João Bosco
da Silva
Sem comentários:
Enviar um comentário