Análise
O sujeito poético usa, neste caso concreto, uma vasto leque
de imagens que, aliadas às aliterações, tentam transcrever em verso, num ritmo
alucinado, o seu estado de espírito, ou desconforto mental, recorrendo ainda a
outras figuras de estilo, se bem que poucas e ordinárias, devendo-se isto à
crise da época e à condição sociocultural do próprio sujeito, como hipérboles em
contraste com alguns eufemismos, poupando assim nas antíteses, usando
simbologia da sua mitologia pessoal, especialmente da infância, disfarçada de
metáforas, é de destacar ainda o recurso a uma poupança na pontuação pelo uso
exclusivo de vírgulas de forma a impor um ritmo quase asfixiante, ilustrando
bem o estado mental no momento da criação poética, sacrifica então a clareza no
discurso, de modo a manter-se fiel à tradução da emoção em palavras, existe um
desprezo pelo leitor, e os temas abordados, pela sua extrema natureza confessional
e pitoresca, podem colocá-lo perante uma composição surrealista, este desprezo
é mais notado comparativamente à dedicação mostrada pela criação anti-poética,
está bem patente a consciência de que mais de setenta por cento do universo poderá
ser matéria escura, uma lobotomia seria uma alternativa para o impulso, quase
necessidade vital, que o sujeito tem em se tornar poético, não é para se
mostrar, nem para lhe beijarem o cu, se bem que um broche, será por ele, sempre
bem recebido, não é para lhe baixarem as calças em submissão contemplativa,
esperando portas abertas, sujeita-se à sujeição poética, simplesmente porque
come demasiada merda que a vida lhe atira aos sentidos e o estômago não aguenta
tudo, tal como o cérebro quando se dorme, digere, fermenta, destila, absorve e
excreta, o sujeito poético, para terminar, está claramente, munindo-se de um par de
paradoxos, a cagar-se.
Turku
01.11.2014
João Bosco da Silva
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