Ronco
“ – the poem oughta be
worth some beer”
al purdy
Enquanto continuarem a dar ouro pela merda dos dentes
branqueados
Pela ignorância, enquanto endeusarem a arte de ter sempre
razão
Sem saberem nada além de rapar os pêlos entre os olhos,
Enquanto se deixarem hipnotizar por letras de canções que
Podiam ter sido escritas por miúdos da quarta classe que já
tocam punhetas,
Enquanto os olhos estupidificarem tudo em que tocam
Por culpa da ligação directa da região occipital aos tomates
e à ganância,
Enquanto usarem só o espelho para ignorar a passagem dos
anos,
Acreditando que a imortalidade está nos balões que insuflam
com agulhas,
Enquanto se achar que a cor da camisola melhor porque minha,
A cor da pele melhor porque minha, o sotaque melhor porque
meu,
Enquanto se usar deus como o papão, quando se quer e convém,
Como quem está sempre doente quando têm que se tirar as mãos
dos bolsos,
Enquanto houver os que apesar de não terem televisão,
Aparecem mais do que o que escrevem e vendem-se ao holofote
mais forte,
Enquanto houver os que estão tão fartos de toda esta merda
Que se deixam afogar em goles intermináveis e rasgam-se
pelos dedos,
Enquanto houver os críticos que criticam só porque não
sabem
Fazer mais nada e querem sempre ficar por cima, mesmo que
capados,
Enquanto houver cegos por opção, porque dentro deles o
mundo melhor
E mais vale ficar enterrado numa avalanche que ser coberto
de merda,
Enquanto houver os que fodem para se encontrarem dentro,
fora deles,
Ou na submissão dos outros e os que são pagos por isso,
Enquanto houver espaço na página e a pastelaria ou o café
Estiverem abertos, enquanto houver tinta, enquanto o sangue
não arrefecer,
Enquanto o mundo for mundo, será tudo uma valente merda,
Ao menos não escondam o focinho nem a piça em espiral,
ronquemos irmãos.
02.02.2015
Turku
João Bosco da Silva
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