“parecendo que não uma
pitada de mau gosto melhora a qualidade de vida”
António Lobo Antunes
Entre ortodoxas, católicas, luteranas e muçulmanas nunca
tive uma budista
E só passei ao lado de um casamento xintoísta, à parte disso,
a caminho da serra,
Encontrei-me muitas vezes com três curvas seguidas, entre
vacas a pastar,
Poços no auge da primavera e cerejeiras em flor, Caeiro
queria ser japonês,
Mas só Bashô consegue ver com clareza absoluta, uma gota de
água
Nunca poderá ser uma gota de ouro e por isso nunca terá
menos valor,
Pára-se o carro ao lado de uma casa de guarda-florestal para
um broche rápido
E logo desce de uma fraga o Gary Snyder com a sua barba
branca
Até se apagar numa passagem de papel-higiénico num roçar de
Bukowski
À espera de um quarto alugado no sofá de uma torre que
partilha o horizonte
Com o castelo, alguém eleva uma revista mas não tem cona,
por isso ninguém dá
Um caralho pelo gesto, no ar longe da condensação dos
suspiros em pé de Hemingway
E a sua neve de papel caindo ao lado das pernas das amantes
e do horror da mulheres,
As garrafas acabam sempre tão vazias quanto o espaço entre
cada golo,
Queria dizer página, queria dizer mulher, queira dizer cona,
queria dizer
Vazio, tão vazio, somos, tão vazios nos queremos, podendo
ter a felicidade
Num aperto de mão que não quer largar, mas largamos tudo,
todas,
E as rãs um sonho acidentado à beira de um poço em verões
que mal se lembram,
O que nos terá feito tão velhos antes da careca de ping-pong
do Miller,
O que nos terá feito tão cansados e salpicados pela tela
toda do Pollock,
Será o medo de um extraterrestre humano, metade nós, ao lado
da juventude,
Quando a juventude já longe dos primeiros pêlos de barba
brancos,
Quando começamos a cair, se chegamos aos vinte já em queda
livre,
Ainda estará livre a namorada Turca, já estará no museu a
ortodoxa,
As luteranas ainda chupam gaitas indefesas nas festas das
empresas,
As católicas continuam a engolir hóstias e gaitas no cu, que
não é pecado,
O Álvaro de Campos deve estar enterrado nos Estados Unidos
Num monte verde, com uma engrenagem desenhada no granito,
Onde se lê, não dei por ela, mas foi minha, a viagem que já
esqueci.
01.12.2016
Turku
João Bosco da Silva
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