quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Morpheus Antes Do Café

Num café arrancado dum filme de David Lynch para uma vila do interior
Numa noite cinzenta do Sul, onde tu entras e logo sei que eu todo dentro,
Tu como uma estranha baunilha perversa me arrancaste a tábua antes
De suster a respiração para o mergulho, o teu amigo barman, sorrisos de lado,
Como posso ser um estranho no meu próprio sonho, como não conheço
Todas estas personagens com que o meu subconsciente me coloniza o sonho,
Nós na casa-de-banho, pintada toda de preto, como outra que conheci
Antes das paredes cobertas de hieróglifos florescentes, eu fascinado
Pela tua divina inocência animal, tão angelical como a descida do favorito,
Então neva em Agosto, mas logo o Sol torna a certeza de um sonho meio
Trapalhão e estavas no fim do degelo, numa igreja trazida de pixels
Ou de uma Boston que nunca visitei, o olhar da tua mãe como o sorriso
Do teu amigo, o teu cabelo como uma cortina ao te dares conta da minha presença,
Encolhi, os mesmos dezasseis anos, afinal tu de ninguém, eu apenas
Mais uma aposta com o teu amigo de café, o seu cabelo o meu cabelo
Oleoso dos dezasseis anos, nunca mais uma resposta tua e eu com uma fome
Que antes não conhecia, antes de me entrares pupilas adentro, antes de te entrar
Até ao equilíbrio térmico de dois corpos de ninguém, por tão pouco,
Só pelo prazer de ver alguém engolir sapos com o coração,
Então o café de David Lynch vencido por um tasco da terra, onde no bolso
A incerteza de pedir em liberdade e uma garrafa que se leva aos lábios
Para te esquecer ainda antes de ter acordado, quando o meu copo
No balcão, ao teu lado, onde me ignoravas com tanta força que parecias gritar.

Turku

03.08.2017


João Bosco da Silva

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