quinta-feira, 9 de janeiro de 2020




Nada de Novo 

Morreste e nesta nova década, continuas morto, parece impossível 
Que haja algo realmente definitivo, algo tão familiar e abismal, 
Incompreensível não voltar a ver o teu cabelo branco rampa acima, 
Enquanto a tua transit da mesma cor te esperava o regresso, 
Preferia ser carro, não sentir a falta de ninguém, era vendido 
E pronto ou apodrecia numa garagem ou numa eira 
Onde garotos perderiam inocências e virgindades na companhia de vespas, 
Não passa de uma semana em que não a veja novamente, 
A dos outros, sempre a dos outros e a minha sempre possível 
A cada instante, contudo a tua é a que mais estranho, 
Todos os teus ódios apagados como a pólvora que acendias 
No escalpe do inimigo em África, o medo às camas armadilhadas 
Um esquecimento encaixotado em forma de eternidade, 
A palidez perfumada das francesas um desejo mudo nos teus lábios, 
Nada nunca mais, e não há nada mais estranho nem mais certo, 
Agarra cada oportunidade, dizias-me, entra em tudo o que se abrir, 
É o que se leva da vida, mas na verdade, da vida não se leva nada, 
Só se estranha tudo, então aborrece e depois nada, 
A década é outra e tu continuas morto e eu não apodreço numa eira, 
Nenhum garoto perdeu a inocência em mim, as vespas só dentro, 
Nem isto é um poema, é só um pedaço de tristeza que não pinga. 

Turku 

09.01.2020 

João Bosco da Silva 

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