Aparição en Arlequin
Quando estive pela primeira vez frente a frente com o Paul
en Arlequin, senti algo como
Se uma aparição, vi-me, não aquele miúdo de cabelo castanho-claro,
numa foto, agarrado
A um ramo de uma árvore para os lados de umas termas
esquecidas, com o mesmo olhar vago
Do Arlequin, mas vi a idade que tinha, já não era o miúdo
que reproduzia em folhas de papel
Cavalinho o quadro do Picasso para o trabalho das aulas de
Educação Visual no quinto ano,
Era todos os pecados que acumulei até então, toda a sujidade
que lavei das mãos desde então
E senti-me traído, por mim mesmo, traída a minha inocência,
ali, em frente ao original,
Senti-me quase envergonhado por não ter dez anos ou menos,
porque o que merecia
Aquele reflexo, era o miúdo de cabelo castanho-claro a
cobrir-lhe a testa e olhar inocente,
Sem sinal de maldade, solene, mesmo que com roupa de
palhaço, senti-me eu o verdadeiro
Palhaço, que trocou a pureza, a inocência, pelo barulho do
demasiado a confundir-se com lixo,
Reparo mais uma vez que a sua posição podia ter sido outra,
como o encontro podia ter sido noutro
Museu, mas foi ali, no Ateneum de Helsínquia,
inesperadamente e fiquei como um pequeno
Alberto Soares ao se ver e não se reconhecer, ao me ver e
não reconhecer o que se reflecte
No quadro, naquele quadro tão familiar, pintado noutra vida
com lápis de cor e mãos pequeninas.
03.05.2014
Turku
João Bosco da Silva
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