quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

 

Entulho 

 

Eu queria olhar os teus lábios e não pensar nas tuas palavras ridículas, 

Deixar o lago da Sanabria gelar há décadas, continuar inocente 

Ao lado dum cavalo qualquer, sentir-me perto de um deus 

Que me diminuiu tantos anos, deixar arder tudo o resto, 

As bandas desenhadas que me moldaram, não o barro, mas o lodo, 

Porque se sou homem, sou feito da lama onde cagaram 

As vacas e os burros a caminho dos estábulos, antes da geada imaculada, 

Antes do adormecer dos avós ao regressarem da última poda 

Aos castanheiros e colapsarem nas mãos sábias e impotentes das netas, 

Eu queria olhar os teus lábios cheios de aves exóticas 

E chamas que querias que queimassem o teu coração, 

Mas não te dediques a voos se o que queres é encontrar entulho para poemas. 

 

06/01/2022 

 

Turku 

 

João Bosco da Silva

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