domingo, 24 de janeiro de 2010


Casa

Tanta expectativa nos alicerces,
Ainda a poucos metros do chão!
Tanta festa quando terminada a placa,
Com metade do trabalho ainda por fazer!
Tanta ilusão e depois a casa uma merda!
Os quartos vazios e frios,
Onde vida, só a do mofo das paredes
E a do bafo da saudade de quem lá entra
Para inspirar o passado de quem lá não está.
A mobília que se foi acumulando,
Deixando de fazer sentido,
Acumulando-se estilos, cores e materiais,
Que ninguém vê.
As paredes começam a ser sulcadas por fendas,
As primeiras infiltrações inesperadas
E a culpa dos vizinhos, sempre dos vizinhos, sempre dos outros.
Os armários demasiado grandes nos quartos pequenos,
Sempre de tamanho insuficiente para o muito lixo que se acumula:
A roupa de Inverno de quem já não está no Inverno,
À espera;
Os brinquedos que não se chegaram a partir
Da criança que partiu para um interior fundo e escuro, além do tempo.
O eco das vozes nos dias de festa,
Longe, no tempo das paredes rebocadas a secar.
As paredes agora mudas,
Confidentes fiéis dos momentos que morreram.
As camas frias esperam quem partiu,
Ignorando que quem partiu não é quem voltará,
Ignorando tudo, porque já não range a madeira dos corpos juntos.
A lareira mais só com o olhar de quem espera que as chamas aqueçam por dentro,
À espera que seja hora.
A mesa que hoje nunca se usa,
Porque não há quem a vista de vida.
Domingo deixou de ser o dia dos paralelos até ao adro da Igreja,
Em família, até ao regresso ao almoço de domingo,
Domingo passou a ser o dormir até não se poder esconder mais.
A casa mais só, porque existe a solidão de quem a pode sentir vazia.
Tanta expectativa nos alicerces...
Cresce e sente a derrota do tempo!

20.01.2010

Savonlinna

João Bosco da Silva

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